Quando ninguém está olhando é mais fácil colocar as palavras lado a lado. Sem se preocupar com as frases que vão se formar e nem com seus significados. Sem pesquisar por sinônimos, sem sentar o dedo no backspace até a página ficar em branco novamente.
Quando ninguém está olhando dá pra ignorar os sublinhados coloridos que vão brotando, denunciando o quanto você digita sem pensar e o quanto ainda precisa aprender. Sem se preocupar onde colocar a vírgula ou se ela está separando, com um muro de mil metros, o sujeito do verbo.
Quando ninguém está olhando dá para fingir que está tudo certo e que as palavras, as vírgulas, os verbos estão todos em seus lugares marcados. E se nada estiver correto basta criar uma narrativa particular na qual tudo foi feito de caso pensado. Os erros, as falhas, as frases sem sentido.
Quando ninguém está olhando dá para repetir uma mesma frase várias vezes, em todos os parágrafos e também no título. E dá ainda para colocar, bem próximo do fim, uma grande mentira. De preferência numa frase solta como se fosse uma importante citação.
Escrevo sem me importar com o que os outros vão pensar.
Quem quiser que acredite e minta antes que alguém abra a porta.
Um texto finalizado nada mais é do que um ato fortuito de coragem (ou imprudência) cometido quando ninguém está olhando. Uma homenagem póstuma a todas as palavras substituídas ou apagadas.
👀 Publicado originalmente no dia 14/02/2021
📷 Foto de Adrienn: https://www.pexels.com/pt-br/foto/foto-de-mulher-atras-da-porta-1459558/